Quem sou eu

O projeto "Longa jornada livro adentro: a análise de textos literários" visa incentivar a leitura e a interpretação de textos de diferentes épocas e estilos. O grupo fará oficinas quinzenais, aos sábados pela manhã, em que se debaterão obras, tendências e outros assuntos do mundo da literatura. Aqui, você confere os tópicos em pauta, os principais itens discutidos nas reuniões e a organização para os encontros futuros. As oficinas se realizarão no auditório da UFFS.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

  Poemas de João Cabral de Melo Neto, que nos fazem pensar nas coisa mais duras e simples da vida, mas que, mesmo assim, tem muito a nos ensinar, serão lidos e analisados no dia 25/11/11 as 16 hs, sala 01 da UFFS

CATAR FEIJÃO

Catar feijão se limita com escrever:
joga-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo:
pois para catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.



Ora, nesse catar feijão entra um risco:
o de que entre os grãos pesados entre
um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a como o risco.


  

A EDUCAÇÃO PELA PEDRA

Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, freqüentá-la;
captar sua voz inenfática, impessoal
(pela de dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
a de poética, sua carnadura concreta;
a de economia, seu adensar-se compacta:
lições da pedra (de fora para dentro,
cartilha muda), para quem soletrá-la.

Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática).
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse, não ensinaria nada;
lá não se aprende a pedra: lá a pedra,
uma pedra de nascença, entranha a alma.



MORTE E VIDA SEVERINA
O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI
— O meu nome é Severino, como não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.
Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia, por causa de um coronel que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem falo ora a Vossas Senhorias? Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias, lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia

com nome de Severino filhos de tantas Marias mulheres de outros tantos, já finados, Zacarias, vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas
e iguais também porque o sangue, que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte severina:
que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir a história de minha vida,

passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.
Um retrato do que chamamos de "minha vida". Esse conto de Caio Fernando Abreo será lido e analisado no dia 25/11/11, as 17 hs, sala 01 da UFFS.
 
Dois ou três almoços, uns silêncios.
Há alguns dias, Deus — ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro.

Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.

Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.

Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração. Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: "Mas ambos estavam comprometidos. Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.

De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia.

Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.

Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Vamos falar de amor com Vinícius de Moraes? Os sonetos e poemas serão lidos  e analisados no dia 18/11, as 17 hs, sala 01 da UFFS.



Soneto da Separação
                           
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.




Soneto de Fidelidade

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.


 Tomara

Tomara

Que você volte depressa
Que você não se despeça
Nunca mais do meu carinho
E chore, se arrependa
E pense muito
Que é melhor se sofrer junto
Que viver feliz sozinho

Tomara
Que a tristeza te convença
Que a saudade não compensa
E que a ausência não dá paz
E o verdadeiro amor de quem se ama
Tece a mesma antiga trama
Que não se desfaz
E a coisa mais divina
Que há no mundo
É viver cada segundo
Como nunca mais


Chega de Saudade

Vai minha tristeza
E diz a ela que sem ela não pode ser
Diz-lhe numa prece
Que ela regresse
Porque eu não posso mais sofrer
Chega de saudade
A realidade é que sem ela
Não há paz não há beleza
É só tristeza e a melancolia
Que não sai de mim
Não sai de mim
Não sai
Mas, se ela voltar
Se ela voltar que coisa linda!
Que coisa louca!
Pois há menos peixinhos a nadar no mar
Do que os beijinhos
Que eu darei na sua boca
Dentro dos meus braços, os abraços
Hão de ser milhões de abraços
Apertado assim, colado assim, calado assim,
Abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim
Que é pra acabar com esse negócio
De você viver sem mim
Não quero mais esse negócio
De você longe de mim
Vamos deixar esse negócio


Uma tragédia pode acabar com o sonho de uma criança. O conto Gaetaninho será lido e analisado no dia 18/11, as 16 hs, sala 01 da UFFS.

GAETANINHO
Antônio Alcântara Machado
- Xi, Gaetaninho, como é bom!
Gaetaninho ficou banzando bem no meio da rua. O Ford quase o derrubou e ele não viu o Ford.
O carroceiro disse um palavrão e ele não ouviu o palavrão.
- Eh! Gaetaninho! Vem prá dentro.
Grito materno sim: até filho surdo escuta. Virou o rosto tão feio de sardento, viu a mãe e viu o chinelo.
- Súbito!
Foi-se chegando devagarinho, devagarinho. Fazendo beicinho. Estudando o terreno. Diante da mãe e do chinelo parou. Balançou o corpo. Recurso de campeão de futebol. Fingiu tomar à direita. Mas deu meia volta instantânea e varou pela esquerda porta adentro.
Êta salame de mestre!
Ali na Rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde. De automóvel ou carro só mesmo em dia de enterro. De enterro ou de casamento. Por isso mesmo o sonho de Gaetaninho era de realização muito difícil. Um sonho.
O Beppino por exemplo. O Beppino naquela tarde atravessara de carro a cidade. Mas como? Atrás da tia Peronetta que se mudava para o Araçá. Assim também não era vantagem.
Mas se era o único meio? Paciência.
Gaetaninho enfiou a cabeça embaixo do travesseiro.
Que beleza, rapaz! Na frente quatro cavalos pretos empenachados levavam a tia Filomena para o cemitério. Depois o padre. Depois o Savério noivo dela de lenço nos olhos. Depois ele. Na boléia do carro. Ao lado do cocheiro. Com a roupa marinheira e o gorro branco onde se lia: ENCOURAÇADO SÃO PAULO. Não. Ficava mais bonito de roupa marinheira, mas com a palhetinha nova que o irmão lhe trouxera da fábrica. E ligas pretas segurando as meias. Que beleza rapaz! Dentro do carro o pai os dois irmãos mais velhos (um de gravata vermelha outro de gravata verde) e o padrinho Seu Salomone. Muita gente nas calçadas, nas portas e nas janelas dos palacetes, vendo o enterro. Sobretudo admirando o Gaetaninho.
Mas Gaetaninho ainda não estava satisfeito. Queria ir carregando o chicote. O desgraçado do cocheiro não queria deixar. Nem por um instantinho só.
Gaetaninho ia berrar, mas a tia Filomena com a mania de cantar o "Ahi, Mari!" todas as manhãs o acordou.
Primeiro ficou desapontado. Depois quase chorou de ódio.
Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do sonho de Gaetaninho. Tão forte que ele sentiu remorsos. E para sossego da família alarmada com o agouro tratou logo de substituir a tia por outra pessoa numa nova versão de seu sonho. Matutou, matutou, e escolheu o acendedor da Companhia de Gás, Seu Rubino, que uma vez lhe deu um cocre danado de doído.
Os irmãos (esses) quando souberam da história resolveram arriscar de sociedade quinhentão no elefante. Deu a vaca. E eles ficaram loucos de raiva por não haverem logo adivinhado que não podia deixar de dar a vaca mesmo.
O jogo na calçada parecia de vida ou morte. Muito embora Gaetaninho não estava ligando.
- Você conhecia o pai do Afonso, Beppino?
- Meu pai deu uma vez na cara dele.
- Então você não vai amanhã no enterro. Eu vou!
O Vicente protestou indignado:
- Assim não jogo mais! O Gaetaninho está atrapalhando!
Gaetaninho voltou para o seu posto de guardião. Tão cheio de responsabilidades.
O Nino veio correndo com a bolinha de meia. Chegou bem perto. Com o tronco arqueado, as pernas dobradas, os braços estendidos, as mãos abertas, Gaetaninho ficou pronto para a defesa.
- Passa pro Beppino!
Beppino deu dois passos e meteu o pé na bola. Com todo o muque. Ela cobriu o guardião sardento e foi parar no meio da rua.
- Vá dar tiro no inferno!
- Cala a boca, palestrino!
- Traga a bola!
Gaetaninho saiu correndo. Antes de alcançar a bola um bonde o pegou. Pegou e matou.
No bonde vinha o pai do Gaetaninho.
A gurizada assustada espalhou a noticia na noite.
- Sabe o Gaetaninho?
- Que é que tem?
- Amassou o bonde!
A vizinhança limpou com benzina suas roupas domingueiras.
Às dezesseis horas do dia seguinte saiu um enterro da Rua do Oriente e Gaetaninho não ia na boléia de nenhum dos carros do acompanhamento. Ia no da frente dentro de um caixão fechado com flores pobres por cima. Vestia a roupa marinheira, tinha as ligas, mas não levava a palhetinha.
Quem na boléia de um dos carros do cortejo mirim exibia soberbo terno vermelho que feria a vista da gente era o Beppino.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Se você fosse por um anúncio em um classificado, o que você compraria ou venderia? Esse conto de Luis Fernando Veríssimo será lido e analisado dia 11/11 as 17hs, sala 01 da UFFS.

Classificados Através da História

SÍTIOVendo. Barbada. Ótima localização. Água à vontade. Árvores frutíferas. Caça abundante. Um paraíso. Antigos ocupantes despejados por questões morais. Ideal para casal de mais idade. Negócio de pai para filhos. Tratar com Deus.

CRUZEIRO – Procuram-se casais para um cruzeiro de quarenta dias e quarenta noites. Ótima oportunidade para fazer novas amizades, compartilhar alegre vida de bordo e preservar a espécie. Trazer guarda-chuva. Tratar com Noé.

ELEFANTES – Vendo. Para circo ou zoológico. Usados, mas em bom estado. Já domados e com baixa do exército. Tratar com Aníbal.
CAVALO – Troco por um reino. Tratar com Ricardo III.
CISNE – Troco por qualquer outro animal de porte, mais moço. Deve ser macho. Tratar com Leda.

LEÃO - Oferece-se para shows, aniversários, quermesses, etc. Fotogênico, boa voz, experiência em cinema. Tem referências da MGM, para a qual trabalhou até aposentadoria compulsória.
ÓRGÃO – Compro qualquer um. À vista. Também a audição, o sistema linfático, etc. Tratar com Dr. Frankenstein, no Castelo

CABEÇAS – Compro para coleção. Tenho as de João Batista, Maria Antonieta e de todo o bando de Lampião.
COZINHEIRA – Procuro. Para família de fino trato. Deve ter experiências em banquetes e uma boa mão para venenos. Se falhar, pode dormir no emprego, para sempre. Tratar com Lucrécia Borgia.
TORRO TUDO – E toco cítara. Tratar com Nero.

BARBADA – Vendo ótima residência por preço de ocasião. Motivo força maior. 117 qtos., 80 banhs., amplos salões, lustres, tapetes, deps. compls. p/ 200 emprg., 50 vagas na estrebaria. Centro de terreno ajardinado. Tratar com Luíz XVI, em Versalhes, antes que seja tarde.
TELEFONE – Pouco usado. Prefixo 1. Tratar com A G Bell.

CASAMENTO – Homem só, boa aparência, situação estável. Procura moça para ser companheira para o resto da vida dela. Procurar Barba Azul.

CORRESPONDÊNCIA - quero me corresponder com qualquer pessoa em qualquer lugar. Escrever para Robinson Crusoé com urgência.
CHICOTE – Correntes, arreios, chapa quente, Cadeirinha de Afrodite, Cabrito Mecânico, grande seleção de alicates, uma prensa, ferros para marcação. Vendo tudo com manual de instrução. Motivo prisão. Tratar com Marquês de Sade.
ASSISTENTE DE PINTOR – Deve ter prática em pintar de costas. Preciso de assistência porque estou momentaneamente impossibilitado de trabalhar. Caiu pingo no meu olho. Procurar Michelangelo, na Capela Sistina.

ENGENHEIRO – Precisa-se, urgente, para substituir elemento demitido motivo embriaguez. Tratar prefeitura de Pisa, Itália.
TRIPULANTES – Preciso para excursão marítima. Jogo tudo nesta empreitada. Tentaremos provar que se pode chegar à Índia viajando para o Oeste. Se conseguirmos, seremos famosos. Se não, a história nos esquecerá. Tratar com Cristóvão Colombo.

 Poemas e sonetos de Mário Quintana, serão lidos e analisados no dia 11/11, as 16 hs, sala 01 da UFFS.



AH! OS RELÓGIOS

Amigos, não consultem os relógios
quando um dia eu me for de vossas vidas
em seus fúteis problemas tão perdidas
que até parecem mais uns necrológios...

Porque o tempo é uma invenção da morte:
não o conhece a vida - a verdadeira -
em que basta um momento de poesia
para nos dar a eternidade inteira.

Inteira, sim, porque essa vida eterna
somente por si mesma é dividida:
não cabe, a cada qual, uma porção.

E os Anjos entreolham-se espantados
quando alguém - ao voltar a si da vida -
acaso lhes indaga que horas são...


POEMINHO DO CONTRA

Todos estes que aí estão
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho!



EU ESCREVI UM POEMA TRISTE

Eu escrevi um poema triste
E belo, apenas da sua tristeza.
Não vem de ti essa tristeza
Mas das mudanças do Tempo,
Que ora nos traz esperanças
Ora nos dá incerteza...
Nem importa, ao velho Tempo,
Que sejas fiel ou infiel...
Eu fico, junto à correnteza,
Olhando as horas tão breves...
E das cartas que me escreves
Faço barcos de papel!



BILHETE

Se tu me amas,
ama-me baixinho.

Não o grites de cima dos telhados,

deixa em paz os passarinhos.

Deixa em paz a mim!


Se me queres,

enfim,

.....tem de ser bem devagarinho,

.....amada,

.....que a vida é breve,

.....e o amor
.....mais breve ainda.


Se eu fosse um padre

Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
— muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,

não citaria santos e profetas:

nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,

Rezaria seus versos, os mais belos,

desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma

...e um belo poema — ainda que de Deus se aparte —
um belo poema sempre leva a Deus!